Há muito se sabe que o sistema tributário brasileiro é por demais oneroso, insanamente complexo e excessivamente fragmentado, com uma multiplicidade de tributos (federal, estadual e municipal) e hipóteses de incidência, afetando assim diretamente o risco das operações. Isso tudo recomenda um cuidadoso planejamento sucessório nos Grupos Familiares em geral.
E é justamente neste contexto que o ITCMD assume especial relevância, especialmente em face das significativas alterações inauguradas pela EC 132/23 no âmbito da reforma tributária, ainda em curso.
Quatro destas alterações merecem, nesta oportunidade, algum destaque:
1. Alteração de competência:
Tratando-se especificamente de bens móveis e títulos ou créditos, a competência tributária desloca-se para o Estado de domicílio do falecido ou do doador, deixando de ser onde se processar o inventário ou arrolamento. Tal alteração não contempla os bens imóveis, que continuam sendo tributados no Estado onde localizados, sem mudanças nesse aspecto.
2. Heranças ou doações no exterior:
Como se sabe, nas hipóteses em que (a) o doador tenha domicílio no exterior ou (b) o de cujus possuísse bens, fosse residente ou tivesse inventário processado fora do país, a cobrança do ITCMD demanda a prévia edição de lei complementar, conforme consolidado entendimento do STF (RE 851.108 – Tema 825). Assim, a nova EC 132/23 pretende, desde já, suprir tal necessidade normativa, estabelecendo, para tanto, regras de competência, transitórias e de aplicação “imediata” (?).
Pois bem, para melhor compreensão do tema, considerando suas múltiplas variantes, o quadro abaixo permite uma identificação sintética da nova formatação atribuída à incidência do ITCMD, segundo as alterações introduzidas pela reforma tributária. Confira-se:
O quadro acima, ao apontar para as diversas intercorrências possíveis, aponta a relevância do planejamento sucessório, dependendo do perfil da localização dos doador/de cujus, do donatário/sucessor e dos bens. Isso recomenda estudo detalhado quanto à viabilidade de determinadas operações, por meio das quais, em compasso com a lei, se poderá reduzir o ônus fiscal afeto ao ITCMD.
Ainda no âmbito da reforma tributária, há também debate sobre o momento de aplicação desse novo regramento. Isso porque é controversa a necessidade de edição de novas leis estaduais para instituição dessas condições, na medida em que o art. 17 da EC 132/23 acaba por prever vigência “imediata”.
Contudo, cabe arguir se, tratando-se de matéria afeta à competência tributária, torna-se fundamental a respectiva regulação normativa, na medida em que, sem ela, não seria possível exercer essa competência sob as novas condições.
De fato, segundo alguns precedentes do STF, normas editadas antes das EC’s quanto à competência não seriam automaticamente “constitucionalizadas”, exigindo-se, assim, nova legislação estadual. Contudo, não se pode ignorar que decisões mais recentes do STF (Temas 1.093 e 1.094) apontam uma flexibilização quanto à “convalidação” de normas editadas, quando posteriormente validadas pela edição de LC.
3. Progressividade de alíquotas:
A progressividade das alíquotas do ITCMD já é realidade na maioria dos Estados, mas a reforma tributária torna obrigatória sua observância, em função do valor do bem.
Este fato, por si só, torna a tributação mais onerosa, dependendo do interesse de cada contribuinte e do perfil do patrimônio, a antecipação de sua transferência (eventualmente com a reserva de usufruto ou de outras cautelas) pode ser uma medida justificável, visando à redução do impacto fiscal.
4. Imunidade – Doações para e por instituições sem fins lucrativos:
Por fim, a reforma tributária amplia a imunidade, de sorte a aplicá-la não apenas às entidades voltadas para a promoção da educação e assistência social, mas também às doações feitas para ou por instituições sem fins lucrativos.
Conclusão
A reforma tributária trouxe profundas alterações no modelo de incidência do ITCMD, com impacto direito na oneração da transferência de patrimônio entre Grupos Familiares.
Tais circunstância recomendam, então, a realização de estudos verdadeiramente específicos para cada caso concreto, em função não só do interesse individual e do perfil dos contribuintes/partes envolvidas, mas também da natureza/valor dos bens e dos limites desejados quanto à sua destinação, sempre em face da perspectiva da majoração significativa das alíquotas (agora em sistema progressivo).
Neste novo ambiente tributário, o planejamento sucessório, seja por meio de singela antecipação da parcela legítima aos herdeiros, ou mesmo da criação de estruturas mais complexas (holdings, fundações, trusts, etc.), assume especial relevância quanto ao ITCMD (sem prejuízo do IRPF, a depender da aplicabilidade da lei 14.754/23).
FONTE: https://www.migalhas.com.br/depeso/419285/impactos-da-reforma-tributaria-no-planejamento-sucessorio